Sofia
Fingia que sorria
Na fotografia
Mas seus olhinhos azuis
Choravam para dentro
Um lamento sem fim
Comia e dormia e nunca saía
Lá ia ganhando algum
A dar explicações de português e latim
Tinha um gato chamado Félix
Com quem gostava de conversar
E um velho telefone analógico
Que teimava em não tocar
Vivia
Na periferia
Com a sua fobia
De grandes multidões
Sem sair de casa
Vivia a fugir
De dia lia a Maria ou a Tvguia
E preenchia alguns cupões
Mas nunca os enviava
Não lhe fosse sair
Tinha uma mesa pé de galo
Onde falava com além
Euma fotografia velha
À qual já não restava ninguém
Ó sofia
Só vez a luz do dia
No reflexo esbatido dos filmes
Na tv
Um dia
De sua autoria
E com fotografia
Vinha um texto no jornal
Que ela demorou anos a preparar
Quem diria
Que viria um dia
Na necrologia
Sofia por ela própria
O texto que ela sempre sonhou publicar
Sobrou um gato chamado félix
Sem ter com quem conversar
E o velho telefone analógico
Não parava de tocar
Ó Sofia
Só vez a luz do dia
No reflexo esbatido dos filmes
Na tv
Ó Sofia
Só sentes euforia
Nos versos de amor repetidos
Em inglês
Ó Sofia
Só vez a luz do dia
No reflexo esbatido nos filmes da tv